mas premente
presente
um pudor intrínseco e inerte
nunca activo
mas deteriorante
nunca velho
nunca impaciente
um pudor parasita
mas vizinho
um pudor de estimação.
strength of voice, dizem uns. ou delighted shouts em erótica setecentista escocesa. o que for.
mas premente
presente
um pudor intrínseco e inerte
nunca activo
mas deteriorante
nunca velho
nunca impaciente
um pudor parasita
mas vizinho
um pudor de estimação.
as palavras são a única coisa que não me falha
por mais que divague do amor fraterno
nada me falha menos que as palavras
pudesse eu e casava-me com elas já
sim, se é eterno caso-me com a arte intrínseca já hoje
e não há mais com o que me arreliar
as palavras são performances
mitos e verdades simultâneas
shows de uma só personagem
ainda assim não solitárias
incoerentes inconstantes impossíveis
mas ainda assim são as que menos me falham, elas
uno puro e incondicional
só mesmo este da arte
só mesmo esta poligamia desmedida
de amar as palavras por igual
dando-lhes a justeza que não encontro para mim
se os peixes tiverem garganta que dê para fazer nós
se conseguirem ficar sem respirar muitos segundos só porque parece que se esquecem de como é
inspirar uma acção activa
uma estranheza nos sítios casa
um nó na garganta tão atado que nada entra nem sai
isto do pouco oxigénio dizem que tolda o pensamento
no caso tolda-me as mãos que escrevem
o frio que me arrepia as pernas é de dentro
afinal até está calor
mas quem está vazio por dentro tem que ter corrente de ar.
five years of a name
one two three without four five
não feches os olhos, querida
é-te mais difícil acordar
finais esperados
reticências antigas a puxar os finais dos finais para perto
tão perto que nada mais se vê à frente
só uma parede
wall wall wall
uma parede cada vez menos fácil de quebrar
as cicatrizes dão-lhe volume, é um fenómeno físico automático
finais não assim tão preparados
mas estranhamente fáceis
dóceis quase na sua ignorância agressiva
e as certezas de certas coisas tornam-se
à espera da sabedoria da idade
nas certezas absolutas de futuros
nas certezas absolutas dos outros
ser sozinha é perder a noção ao cozinhar
quão triste é cozinhar para um?
limpar as notificações
ignorar o telefone que toca
estar exausta não saber porquê
será que a janela ficou aberta?
mentir
deixar de ser poeta aí
porque o poeta nunca mente
engana-se redondamente
mas mentir não mente
acho até que o poeta é incapaz disso
porque assim perdia o título
o sindicato dos poetas tirava-lho por certo
e lá se ia o subsídio
foi-se-me o subsídio
com uma mentira destas foi-se-me vitalício
se calhar foi só por ser domingo
fecha os olhos e descansa agora prosadora
que
se calhar
foi só por ser domingo
de facto, não a conheço muito bem
poucas vezes me visita
acena-me de longe
às vezes só com o queixo numa leve onda para baixo
e atravessa para o outro lado da rua para não me encarar
quando me visita
há que admitir que fujo
só um bocadinho, toda a gente sabe que eu não corro
mas o suficiente para ela me perder de vista por uns tempos
o suficiente
só o suficiente para eu me voltar a enlear
[uma só linha, um compasso e meio de música. três vozes a desfazer o maior dos tabus. essas cicatrizes internas, quem pensa que só as há do lado de fora é porque nunca pensou por dentro, nunca se experimentou ler por dentro como que em braille, a usar outros sentidos para além do olhar. que virtude de dois gumes essa, a de se desenminhocar por dentro, que aguçados os gumes a afagar o ego do ser omnisciente e a perfurar mais fundo e mais agudo em cada dor.
engraçado isto:
ver-se por dentro
é igual a
ver-se de fora]
and so are mine.
se puder ser a dos lábios cor-de-fogo
nem me importo de voltar a entrar em personagem
é mais inesperado o que se segue antes do baixar da cortina
os dourados brilham menos
os pingentes são mais tímidos
consegues ler as rugas na pele e no papel
deste lado do palco
como não antes