domingo, 19 de abril de 2015

arroz para um

ser sozinha é perder a noção ao cozinhar
quão triste é cozinhar para um?

limpar as notificações
ignorar o telefone que toca
estar exausta não saber porquê
será que a janela ficou aberta?

mentir
deixar de ser poeta aí
porque o poeta nunca mente
engana-se redondamente
mas mentir não mente
acho até que o poeta é incapaz disso
porque assim perdia o título
o sindicato dos poetas tirava-lho por certo
e lá se ia o subsídio

foi-se-me o subsídio
com uma mentira destas foi-se-me vitalício
se calhar foi só por ser domingo

fecha os olhos e descansa agora prosadora
que
se calhar

foi só por ser domingo

terça-feira, 7 de abril de 2015

tu.


tu sabes as coisas que sabes
clamas que o que sabes fui eu que te ensinei
mas o que me ensinaste acima de tudo foi de ti

aprendi-te aos poucos
aos tropeções e solavancos
mas o que é facto é que me levantei sempre
e te aprendo ainda

sei-te coisas que nem tu te lembras
coisas que te fariam rir se as soubesses
as banais e as outras, mais fundas
aquele sinal vermelho na cabeça debaixo do cabelo
a predilecção pelos cheiros em vez dos outros sentidos todos
como te comoves com o belo
e comoves-te sempre com o mais simples do belo, é verdade

tu sabes cada vez mais de tudo,
passaste-me à frente já há muito
acho que ambos sabemos disso bem
mas tu, querido, empoleiraste-me num pedestal
confias-me o teu âmago
mesmo que não saibas bem o que ele é

comovo-me eu com a tua paixão das coisas
com a tua rapi e rispidez
comovo-me sempre cheia com o facto de saber como te fazer rir

sonho-te e descubro que ainda sei mais do que me lembro
os caprichos, os azares
o que fizeste a semana passada e o que sonhas para o futuro
o que timidamente sonhas para o futuro
e mascaras de outras ambições

irrito-me ainda, por mais que o preveja,
com as pequenezes do teu ser
por mais que te conheça quero sempre surpreender-me mais
e ver sempre aquele. aquele tu que eu sei que existe
e que tive a honra de mo mostrares.

sei-te muito, e não foi fácil.
mas ainda mais hei-de saber.
basta aperceber-mo-nos destas portas escancaradas


sei, acima de tudo, que vales a pena.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

não tomo cafés com a minha auto-estima

de facto, não a conheço muito bem

poucas vezes me visita
acena-me de longe
às vezes só com o queixo numa leve onda para baixo
e atravessa para o outro lado da rua para não me encarar

quando me visita
há que admitir que fujo
só um bocadinho, toda a gente sabe que eu não corro
mas o suficiente para ela me perder de vista por uns tempos

o suficiente
só o suficiente para eu me voltar a enlear